terça-feira, 27 de abril de 2010

2009 acabou?

                            Artigo José Dirceu
           Os movimentos econômicos dos últimos anos são profundamente didáticos para quem quer entender os mecanismos de perpetuação da hegemonia de uma oligarquia financeira nos EUA e no mundo. De meados de 2008 ao fim de 2009, vimos a mais grave crise do capitalismo em 150 anos. Tão logo os mercados se viram na iminência de dissolução, propalou-se a tese da necessidade de reformulação do modelo financeiro vigente e de adoção de meios de regulação para se impedir, e punir, as obscenidades que levaram ao descontrole. 
    Em uníssono, todos pediram a presença do Estado, logicamente via recursos públicos, para socorrer aos protagonistas da crise. Nos maiores centros, EUA e Europa, que ainda concentram as instâncias decisórias, tomaram a dianteira as nações que propuseram intervenção maior do Estado. Assim, a saída foi a injeção de trilhões de dólares na economia —só nos EUA, o valor chegou a um PIB brasileiro! 
    A contrapartida estaria em duas vertentes: compromisso maior de retorno à sociedade e mudança nas regras de atuação dos agentes econômicos. Caminhou-se para reforma dos organismos como o FMI (Fundo Monetário Internacional), o Bird (Banco Mundial), a OMC (Organização Mundial do Comércio) e a ONU (Organização das Nações Unidas), sempre com o intuito de possibilitar maior participação dos demais países e dos novos atores emergentes —como Brasil, China, Índia, Rússia e África do Sul, entre outros.  
     Próximo de completar dois anos do estopim da crise, o mundo vê que, principalmente por parte dos EUA, foram mínimas as exigências de contrapartida pelo socorro de trilhões. A banca estava de joelhos e caberia aos Estados retomarem a condução do processo de desenvolvimento, cobrando um compromisso maior. Mas o tempo passou, 2009 se foi e, hoje, o mercado retoma as mesmas práticas pré-crise e se vê em condições novamente de frear a regulação estatal.
     A bem da verdade, se havia expectativa com a crise de profundas alterações, hoje, vemos que pouco mudou: a fraude e a manipulação dos mercados continuam, não há regulação e fiscalização, o sistema e as instituições mundiais não passaram por reformas, enfim, seguimos nas mãos dos especuladores.
   Nesse contexto, a desvalorização do Yuan chinês é apontada como vilã, mas na verdade são os EUA que forçam o dólar para baixo unicamente com o objetivo de passar a conta da crise para outros países —inclusive o Brasil, que precisa atuar no câmbio. A China está apenas dizendo aos EUA que não será em cima dos chineses que os americanos irão navegar. 
   Enquanto isso, no Brasil, o presidente do Banco Central defende a alta dos juros, dizendo que é possível aumentar a Selic sem fazer o carro capotar, porque dá para conduzir “uma política racional abaixo do Equador”. Defende o receituário rentista, esquecendo-se de que é acima da linha do Equador que predominam as políticas irracionais que levaram à crise e que voltam a ganhar força. Parece que nada se aprendeu com a crise e que evaporou o poder de pressão dos governos ante ao mercado. É preciso dizer que 2009 não acabou.

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